O Brasil em destaque na COP 27 e o fator Lula

Como uma de suas primeiras decisões após a vitória nas eleições presidenciais deste ano, Lula aceitou o convite para participar da COP 27, Conferência do clima da Organização das Nações Unidas (ONU) que se iniciou esta semana no Egito. Sua participação gera enormes expectativas, tanto para o Brasil quanto para o mundo, e chega em um momento crucial para o planeta, em que medidas drásticas deverão ser tomadas para que não ultrapassemos o chamado “ponto de não retorno”, quando os efeitos provocados pelo aquecimento global e pela degradação ambiental se tornam irreversíveis.

Ato LULA com Artistas

No Brasil, a expectativa é por uma sinalização do futuro governo Lula mais explícita de como será a coordenação e o posicionamento do país dentro do debate ambiental. Durante o mandato de Bolsonaro, o desmonte nas políticas de proteção ao meio ambiente e os altos índices de desmatamento foram alvo de críticas por parte de ambientalistas[1] e questionados pela comunidade internacional. O episódio do “passar a boiada” em 2020[2], no auge da pandemia de Covid-19, se tornou uma síntese de uma forma de atuação do governo brasileiro.

Como contraponto a atuação do governo atual, desde o processo eleitoral Lula apontou a questão ambiental como uma de suas prioridades. A aliança com Marina Silva, ex-ministra do Meio Ambiente, trouxe ainda mais corpo à narrativa de que 2023 será um ano de reconstrução. Espera-se que uma das primeiras medidas do governo seja fazer um grande “revogaço” em atos do governo federal no campo ambiental. Alguns desses atos, como o que reduziu o espaço da sociedade civil no Conselho Nacional de Meio Ambiente (Conama), e o que prevê a anulação de multas ambientais avaliadas em mais de R$16 bilhões, foram apontados por aliados de Lula como importantes a serem revogados.[3]

Para grupos da sociedade civil, o governo deve ser enérgico e trabalhar essa reconstrução no meio ambiente retirando o máximo de medidas que sejam prejudiciais à proteção. De acordo com o Política por Inteiro, seriam necessários a revogação ou revisão de 401 atos do Poder Executivo Federal (de 2019 a 2022) para que se possa reconstituir a agenda ambiental e climática brasileira[4]. Além disso, o restabelecimento de espaços formais de diálogo com a sociedade civil deve possibilitar que futuras decisões sejam promovidas de forma construtiva, ouvindo diferentes grupos e atores.

No campo internacional, a COP 27 será uma grande oportunidade para que Lula possa se reapresentar para o mundo neste vindouro mandato de presidente. Ainda se encontra nas memórias da comunidade internacional, a capacidade de articulação de Lula e seu protagonismo no início do século XXI, que foram fundamentais para construção de grupos como o G20 da Organização Mundial do Comércio (OMC) e o BRICS. Apesar de estarmos em uma conjuntura bem diferente daquela de 20 anos atrás, com um mundo mais protecionista, existe um sentimento de que o Brasil possa retomar um papel de maior protagonismo no campo ambiental. E que, desempenhando tal função, possa contribuir para que tenhamos ações mais efetivas que busquem a neutralidade climática, possibilitando com isso que o aquecimento global fique limitado a 1,5 °C acima das temperaturas da era pré-industrial.

Alguns movimentos do efeito da vitória de Lula no campo ambiental internacional já são vistos. Os governos da Noruega[5] e da Alemanha já sinalizaram a retomada dos investimentos no Fundo Amazônia. O Fundo está suspenso desde que o governo Bolsonaro promoveu mudanças que extinguiram o comitê gestor do fundo[6], além do enfraquecimento das medidas de combate ao desmatamento e de proteção ao meio ambiente.

Além disso, especula-se que o Brasil possa formar uma aliança estratégica com as principais nações de floresta tropical, em uma espécie de “OPEP para florestas tropicais”. A aliança com Indonésia e República Democrática do Congo, que junto com o Brasil abrigam 52% das florestas tropicais remanescentes do mundo, pode contribuir para que haja propostas e atuação conjunta no campo do financiamento e também sobre o mercado de carbono. Existe o receio, entretanto, que esta aliança possa fortalecer um processo de financeirização da natureza que afastaria o planeta de tomar ações reais para enfrentar a crise climática. Este é o alerta, por exemplo, do grupo Carta de Belém[7]

Há ainda a possibilidade de se constituir um bloco Amazônico contra o desmatamento. A Colômbia, através de sua ministra do meio ambiente Susana Muhamad, indicou que apresentará a proposta de criação deste bloco que vise a cooperação entre os países para salvar o bioma amazônico[8]. Vale mencionar que Lula integrará a comitiva das autoridades ligadas ao Consórcio de Governadores da Amazônia Legal, que terá um espaço próprio na COP.[9]

Por fim, existe uma pressão de um conjunto de ONGs e movimentos ambientalistas para que o Brasil anuncie a intenção de sediar a COP 30, em 2025[10]. O movimento seria uma forma de indicar de antemão seu protagonismo no campo ambiental. Entretanto, apesar do simbolismo em sediar um encontro internacional sobre o meio ambiente no Brasil (vide Rio 92 e Rio+20), uma decisão como essas poderia ser tomadas após a efetivação das ações internas de reconstrução das políticas e instituições públicas socioambientais, além de uma maior avaliação sobre a capacidade econômica de promover um evento deste tamanho, visto que além da crise financeira há internacionalmente a necessidade do país em cumprir com suas contribuições obrigatórias junto a organismos internacionais, como a FAO[11], que ameaça até o seu direito a voto nestes espaços.

Trata-se, portanto, de uma conferência climática em que os holofotes estarão virados para o Brasil, em especial para a participação do Lula, que estará acompanhado de Marina Silva, Simone Tebet, e de uma delegação que o acompanhará em suas reuniões com lideranças globais. Acompanhar os rumos dos debates que ocorrerão no Egito durante esta e a próxima semana será fundamental para entender os rumos da política ambiental brasileira nos próximos quatro anos.